Busca pelo conhecimento, o melhor remédio para os males causados pelas fake news
Na área da saúde as notícias falsas também causam sérios danos a pessoas que não desconfiam de remédios sem comprovação científica e nem de promessas de curas milagrosas.
Notícias falsas divulgadas com a intenção de incitar as pessoas a terem determinados comportamentos – influenciando decisões, provocando revolta e dúvida sobre como agir dentro de princípios e valores – já tomaram grandes proporções nos dias de hoje. Também chamadas fake news, elas cresceram no Brasil e no mundo devido à deficiência na Educação, facilidade de acesso à internet e a redes sociais, onde são partilhadas em sua maior parte.
Elas costumam abordar acontecimentos atuais polêmicos ou que estão em discussão. Assim, quem lê essas informações é levado a acreditar nelas, principalmente se a notícia trata de um tema favorável às crenças ou intenções desse leitor ou, ainda, se ele está procurando formar uma posição congruente aos dados errôneos acerca de determinado assunto.
Esse tema é tão sério que em 30 de junho deste ano foi aprovado no país o projeto de lei 2.630/2020, que busca combater a disseminação de informações falsas na internet. Dessa forma, foi dado um claro sinal de que é fundamental conhecer e entender esse universo que confunde liberdade de expressão com crimes de calúnia e difamação, agredindo a honra, a reputação e a paz de milhares de pessoas.
Na área da saúde as notícias falsas também causam danos físicos e mentais a pessoas que não desconfiam e nem checam as propagações de curas milagrosas, remédios e substâncias indicadas para diversas doenças, colaborando muitas vezes para agravar o seu estado.
“Eu vejo dois grandes tipos de segmentos de fake news sendo disseminados na internet. O primeiro é aquele sem o menor nexo e embasamento, que eu associo a um sticker (figurinha digital) de uma ave com cabeça de peixe, carregando um macaco enquanto sobrevoa o mar. Embaixo dela está escrito: – Isto me parece real”, alerta o Diretor-Superintendente de pesquisa do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEP), Dr. Luiz Vicente Rizzo.
Ou seja, há um formato de mensagens, o qual é mais fácil de se perceber que é totalmente enganoso e que faz parte de um imaginário fantástico ou da seara dos absurdos, conforme ele. O segundo modelo é o mais perigoso e diz respeito às informações que mesclam verdades e mentiras. “Se a pessoa não checar adequadamente pode ser facilmente ludibriada. E o pior, ela pode disseminar falsas informações para um grande número de pessoas”.
Conforme o Médico, é importante lembrar que “os números não mentem, mas os mentirosos usam números”. Um grande exemplo dessa afirmação pode ser encontrado no uso indevido de pesquisas científicas, principalmente no que se refere a trabalhos em preprint (pré-impressão). “A pessoa mal-intencionada lança mão de um artigo sem ter sofrido todo o escrutínio que um trabalho científico costuma passar e o coloca como verdade ou então mistura fatos irreais aos seus escritos. Tristemente estamos vendo isso acontecer”.
Outro enfoque levantado pelo Dr. Luiz Rizzo é o uso da retratação de trabalhos científicos como se fosse regra, quando na verdade é uma exceção. “Devemos publicar artigos tendo como princípio suas reais evidências, análises e controles dentro do parâmetro absolutamente adequado”.
Para ele, essa discussão é fundamental, pois é a partir de pesquisas científicas, ou seja, da produção de conhecimento que se adotam protocolos, tratamentos e mais avanços na ciência, baseados em testes, evidências, observações e aprofundamentos. Por isso, a sua integridade deve ser preservada e não distorcida.
Logo, o papel do profissional da saúde para diminuir a propagação das fake news é estar atento às pesquisas, inovações, novas tecnologias e novos tratamentos comprovados. Para a sociedade de forma geral, o cientista acredita que a maior arma contra as notícias falsas é a educação. “Precisa ter vontade e curiosidade de checar as informações, prezar pela saúde e duvidar de dados mal interpretados e sem comprovações ou fundamentos reais”.
Nesse aspecto, o Dr. Luiz Rizzo aposta no Ensino e em bons professores. “Não podemos transferir as responsabilidades”. Para ele, as instituições de ensino devem ensinar as crianças a exercitarem com afinco pensamentos abstratos. “Se elas tiveram defasagens de aprendizado nos níveis básico e fundamental, o médio precisa corrigir. Se foi no médio, o superior tem de dar a solução. Aqui no Ensino e na Pesquisa Einstein, tomamos para nós a responsabilidade desses casos”.
Em sua opinião, é essencial que o médico aja também como um professor diante de seu paciente. “Ele precisa explicar todos os processos da doença, do tratamento e todos os riscos, colaborando para que nem a pessoa enferma e nem seus familiares sejam enganados por falsas promessas”. O profissional da saúde e os alunos dessa área também podem colaborar para diminuir a propagação de informações errôneas, compartilhando orientações e esclarecimentos relevantes também no formato virtual.
Assim, eles apoderam-se de meios para driblar a desinformação em conjunto com as más-intenções, desenvolvendo a confiança de pacientes e da sociedade para que não cultivem o hábito de acreditar mais na internet do que nas evidências científicas.
Segundo o Diretor-Superintendente, as fake news na área médica podem dificultar o trabalho, principalmente se o profissional atuar no sistema público, como no caso da vacinação, campo atualmente bastante fértil para informações infundadas. É o caso de espalhar a mensagem de que a vacina H1N1/Influenza A causará uma doença desmielinizante (que atinge o sistema nervoso, causando prejuízos na sensação, movimento, cognição e outras funções dependendo dos nervos envolvidos, como a esclerose múltipla).
E com a pandemia atual, muitas informações falsas sobre o novo coronavírus e a COVID-19 têm circulado na internet, o que aumenta a preocupação dos profissionais da saúde sobre o impacto dessas mensagens. Elas podem influenciar negativamente o setor colocando em risco os seus diversos aspectos que vão do diagnóstico, comportamento e cura de doenças.
A prova disso é que, antes mesmo de uma primeira vacina contra o novo coronavírus ser aprovada e distribuída, há quem já esteja fazendo apologia contra o medicamento. “Certas pessoas querem criar pânico na população dizendo que as vacinas como um todo fazem mal. Sim, podem causar eventos adversos para uma em 40 mil, por exemplo, assim como qualquer outro remédio”, afirma o Dr. Luiz Rizzo.
De acordo com ele, esses atos provocam claramente danos negativos à saúde pública. Um exemplo atual é o de que no início de setembro deste ano foi constatado, segundo índices do Programa Nacional de Imunização, que a cobertura vacinal está em 51% para o calendário infantil. O ideal é que fique entre 90% e 95% para garantir proteção contra doenças graves como sarampo, coqueluche, meningite e poliomielite.
Na análise do cientista, isso pode ser atribuído a fatores como fake news, sendo o principal deles a falta de conhecimento. “Eu acho um disparate estarmos discutindo a necessidade de vacinação, sendo que o único remédio que erradicou uma doença no mundo foi exatamente a vacina. Nesse caso estou falando da varíola”.
Outro retrocesso em sua opinião é o fato de há 10 anos, os cientistas terem começado a discutir sobre como fazer a edição gênica para curar doenças genéticas, como por exemplo, a anemia falciforme (alteração genética, caracterizada por hemoglobinopatias), achar a cura da talassemia (desordem hereditária que pode causar grave anemia) e de alguns tipos de cânceres ou corrigir uma doença no neonato (antes de a criança apresentar sintomas). “E hoje temos de nos atentar para esclarecer que não há DNA de alienígena em tratamentos médicos”, finaliza, referindo-se às declarações supostas pela Médica Stella Immanuel.
Nascida em Camarões, na África, e residente no Texas, Estados Unidos, ela que é defensora do uso da hidroxicloroquina para tratamento de COVID-19 também já afirmou que cientistas estavam preparando uma vacina para impedir que as pessoas fossem religiosas.