Ciência e Vida

Cirurgia aberta se mostra mais eficaz contra câncer do colo do útero que laparoscopia

​Estudo internacional conduzido com a participação do Einstein contribui para possíveis mudanças nos protocolos de tratamento do câncer do colo do útero.

​A cirurgia convencional aberta se mostrou mais eficaz para o tratamento do câncer do colo do útero do que a laparoscopia (procedimento considerado minimamente invasivo), segundo estudo internacional publicado em outubro do passado pela prestigiada revista científica The New England Journal of Medicine (NEJM).

​De acordo com esse estudo, a taxa de mulheres que passaram por histerectomia radical padrão (procedimento para retirada do útero) e não tiveram recidiva de tumores no colo do útero foi de 96,5% ​após um período de 4,5 anos da data da cirurgia. Entre aquelas que passaram por cirurgia laparoscópica, no entanto, a taxa de sucesso para o mesmo período foi de 86%.

Esses resultados foram considerados tão expressivos que o Comitê de Monitoramento de Dados e Segurança da pesquisa pediu a interrupção da análise antes mesmo de chegar ao fim.

O estudo envolveu 33 centros de pesquisas de oito países, entre eles o Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEP), e avaliou os dados de 319 pacientes, focando a comparação em mulheres com tumores de até 4 cm e restritos ao colo do útero (estágio IB1).

Procedimentos minimante invasivos serão indicados para casos específicos

​Médico ginecologista do Núcleo de Cirurgia Robótica do Einstein, Dr. Mariano Tamura foi um dos autores desse estudo. Segundo explica, as técnicas minimamente invasivas continuam sendo muito importantes porque ajudam no pós-operatório, minimizando os efeitos e as possíveis complicações da cirurgia. No entanto, após esse estudo, o uso de tal técnica tende a se tornar mais limitado no tratamento do câncer do colo do útero.

“Alguns grupos específicos, como pacientes com tumores pequenos, menores que 2 cm, ainda podem se beneficiar da laparoscopia sem provável comprometimento do resultado oncológico, ou seja, sem aumentar recidivas e comprometer o tratamento”, comenta.

Em editorial publicado no mês seguinte à divulgação do estudo, a NEJM reforça a importância dessa pesquisa científica para o futuro do tratamento do câncer do colo do útero, além de sugerir que, enquanto não houver informações mais detalhadas sobre o uso da laparoscopia contra esse tipo de tumor, os cirurgiões tenham cautela na escolha do procedimento a ser usado, informando suas pacientes sobre esses recentes resultados e avaliando os prós e contras em cada caso.

Efeitos positivos da cirurgia aberta foram surpreendentes 

Mais do que efeitos reduzidos das técnicas cirúrgicas minimamente invasivas contra o câncer de colo do útero, sejam elas com auxílio de robô ou não, a principal constatação do estudo refere-se aos bons resultados observados no tratamento com histerectomia radical padrão.

“Embora ainda não saibamos exatamente o motivo, o que nos surpreendeu nesse estudo foram os resultados da cirurgia convencional aberta, que não só foram melhores que os da cirurgia minimamente invasiva, mas também superiores quando comparados aos resultados de estudos anteriores”, avalia Dr. Tamura.

Para ele, tal descoberta deve ser lembrada e discutida por profissionais de saúde neste 4 de fevereiro, Dia Mundial de Combate ao Câncer – data criada pela União Internacional de Controle do Câncer (UICC) com o objetivo de reforçar a importância de adoção de hábitos saudáveis e do diagnóstico precoce no controle da doença.

“Com esse estudo teremos ainda mais embasamento científico para definir as melhores formas de tratamento contra o câncer do colo do útero, que é o quarto mais frequente em diagnósticos e em número de óbitos nas mulheres”, justifica o médico.

No Brasil, segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca), mais de 16 mil mulheres foram afetadas pelo câncer do colo do útero em 2018.

Dr. Tamura explica que os protocolos de conduta para o tratamento da doença no Brasil são os mesmos preconizados internacionalmente e as alternativas variam de acordo com o estágio da doença. O maior desafio, no entanto, segundo o especialista, é descobrir o tumor precocemente. “Infelizmente, muitas mulheres no nosso país ainda são diagnosticadas tardiamente, com a doença já avançada, o que diminui a probabilidade de cirurgia ou de outro tratamento curativo”, avalia.

Participação do Einstein no estudo

O IIEP participou do estudo ao lado de alguns dos centros de pesquisa mais importantes do mundo, como MD Anderson Cancer Center (Estados Unidos), First Affiliated Hospital of Wenzhou Medical University (China) e National Health and Medical Research Council Clinical Trials Centre (Austrália).

Segundo detalha Dr. Tamura, a participação do Einstein envolveu o recrutamento de pacientes, diagnósticos e tratamentos da doença e a coleta e o armazenamento de dados. “Todos os resultados referentes às 20 mulheres que selecionamos foram usados na pesquisa e elas continuam sendo acompanhas por nós até hoje”, informa.

Para ele, a participação do Einstein nesse estudo multicêntrico ratifica ainda mais o nível de excelência que a instituição conquistou na área de pesquisa. “Propor-se a realizar um estudo de padrão tão elevado quanto esse exige estrutura, competência, responsabilidade e comprometimento”, afirma.

​Além do Dr. Tamura, outro profissional do Einstein também atuou na coordenação do estudo: o cirurgião ginecológico Dr. Renato Moretti Marques. O Brasil também foi representado pelos centros de pesquisas do Hospital de Câncer de Barretos e do Hospital Erasto Gaertner, de Curitiba.

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