Relação entre obesidade e câncer desafia profissionais da saúde
Prevenção, tratamento e pós-tratamento da gordura excessiva no organismo têm ligação direta com o câncer, conforme pesquisas científicas publicadas recentemente
Estudos demonstram que o acúmulo excessivo de gordura no tecido adiposo é um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento de câncer. De acordo com a Médica Nutróloga da Oncologia e Hematologia do Einstein, Dra. Andrea Pereira, é latente a relação da obesidade com a doença. Ela é uma das autoridades da Instituição que integra a comissão científica do XIII Board Review in Medical Oncology organizado pelo Ensino Einstein.
São 13 tipos de câncer diretamente associados com a obesidade, impactando esôfago (adenocarcinoma), estômago (cárdia), pâncreas, vesícula biliar, fígado, intestino (cólon e reto), rins, mama, ovário, endométrio, meningioma, tireoide e mieloma múltiplo. Possivelmente também a doença tem relação com tumores de próstata (avançado), mama (em homens) e linfoma difuso de grandes células B.
A explicação para essa forte relação é o fato de o excesso de gordura corporal provocar um estado de inflamação crônica, assim como o aumento nos níveis de determinados hormônios, que podem promover o crescimento de células cancerígenas, criando mais chances de desenvolvimento da doença.
Produção científica
Considerado uma epidemia mundial, o excesso de gordura é o segundo maior fator de risco evitável para o câncer, ficando atrás apenas do tabagismo. No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, pelo menos 41 milhões de pessoas estão com obesidade, ou seja, com Índice de Massa Corporal (IMC) de 30 kg/m2.
Conforme o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a redução dos níveis de obesidade no país pode evitar 19% dos casos da doença. Além disso, a prática de atividade física e a alimentação saudável podem culminar na redução de 63% dos tumores de boca, faringe e laringe. A redução da obesidade ainda pode contribuir para que o câncer de mama tenha sua incidência diminuída em 30%.
Durante o tratamento de tumores cancerígenos, a obesidade pode ser um fator complicador, causando mais efeitos colaterais, conforme explica a Dra. Andrea, ocasionando mais complicações pós-cirúrgicas, tais como infecções. “No pós-tratamento, quando o paciente com obesidade já está no processo de cessar a quimioterapia e ou a radioterapia, pode haver um risco maior de recidiva da doença ou ainda o desenvolvimento de um segundo câncer”.
Portanto, o excesso de gordura no organismo influencia na prevenção, no tratamento e no pós-tratamento, ressalta a Dra. Andrea, autora do livro “Dieta do Equilíbrio – a melhor dieta anticâncer”.
Hiperinsulinemia como fator de risco
Há ainda uma evidência importante de que os níveis elevados de insulina aumentem o risco para os tumores cancerígenos de mama, de intestino, pâncreas e de endométrio. Um relevante estudo do National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES), com 9.000 participantes, apontou que a hiperinsulinemia (definida como > 10 uU/mL) foi associada ao dobro do risco de morte por câncer. “A insulina promove a formação tumoral por mecanismos diretos e indiretos e está relacionada ao aumento de fatores de crescimento como os IGF-1 e IGF-2 (hormônios)”.
A relação entre o excesso de gordura corpórea, especialmente a abdominal, a hiperinsulinemia e o surgimento de tumores está evidenciada em diversos artigos científicos. “Qualquer tratamento que vise a diminuição do grau de obesidade pode reduzir o risco de câncer”, destaca.
Cirurgia bariátrica
Nesse sentido, a Nutróloga cita as cirurgias bariátricas como redutoras de ameaça do câncer. O procedimento é hoje a melhor indicação para a obesidade grave. “Por exemplo, nós a recomendamos quando o paciente tem um IMC acima de 35 Kg/m2 com comorbidades associadas ou acima dos 40 Kg/m2, sem essas comorbidades”.
Estudos recentes demonstram que a longo prazo as cirurgias bariátricas, basicamente a derivação gastro jejunal em Y de Roux (bypass gástrico), técnica mais empregada no Brasil e no mundo, mitigam a mortalidade ligada a complicações cardiovasculares e ao câncer.
Atualmente cerca de 30 pesquisas publicadas constatam esse resultado. Uma delas, realizada na Universidade de Utah nos Estados Unidos, comparou dois grupos de obesos com características clínicas semelhantes. O primeiro passou pela cirurgia bariátrica e o segundo foi submetido a tratamento clínico. Após 14 anos de acompanhamento, houve uma diminuição de 24% da incidência de neoplasias malignas em mulheres, principalmente de útero.
Outro importante estudo similar foi realizado na Suécia. Ele também comparou pacientes submetidos a cirurgias bariátricas e a tratamentos clínicos, os quais são acompanhados por mais de 20 anos. O grupo operado, composto na maioria por mulheres, apresentou menor incidência de câncer de útero e mamas. O seguimento da pesquisa soma no momento quase 30 anos e constata que o câncer em homens começa a ser menor no grupo que passou pela operação.
O controle da inflamação característica da obesidade, a regulação do eixo endócrino dos hormônios sexuais e a quase sempre normalização dos níveis de insulina do sangue, além de potenciais efeitos reguladores secundários à alteração do trânsito do alimento pelo tubo digestivo após tal cirurgia, podem contribuir com menor potencial oncogênico da obesidade.
Para a Nutróloga, faltam Médicos especialistas em obesidade tanto no Brasil quanto no mundo. Quem se interessa pelo assunto associado a essa profissão deve investir em estudos e especializações como: Fisiopatologia da obesidade, Cirurgia bariátrica e a Obesidade relacionada ao câncer.
A World Obesity Federation divulgou em março deste ano um relatório informando que a obesidade deve atingir quase 29,7% da população brasileira adulta em 2030. “Com o mercado crescendo, a demanda por especialistas dessa área crescerá ainda mais”, finaliza.
Para se aprofundar nas novidades da Oncologia, o Ensino Einstein realizará, de 03 a 06 de agosto, o XIII Board Review in Medical Oncology: Atualização, Discussão e Inovação. Confira aqui: XIII Board Review in Medical Oncology.