Diagnóstico precoce e manejo da disfunção muscular adquirida contribuem na recuperação do paciente crítico
A mobilização precoce é um tratamento eficaz para a recuperação de pacientes internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)
O foco de todo tratamento proposto em saúde é a recuperação do paciente e o seu bem-estar. Sendo assim, entender sobre a disfunção muscular decorrente da internação em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), e especialmente as condutas para revertê-la, é uma das competências do Fisioterapeuta que atua nessa área.
Essa importante complicação da fraqueza adquirida na UTI ocorre em aproximadamente metade dos pacientes internados, podendo levar a desfechos desfavoráveis por até cinco anos após a internação, além do aumento da mortalidade. Estudos recentes apontam que o paciente crítico pode perder de 10 a 20% da sua massa muscular em uma semana apenas, acometendo especialmente a musculatura periférica e o diafragma, principal músculo respiratório.
De acordo com a Fisioterapeuta Referência do Departamento de Pacientes Graves do Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), Carla Luciana Batista, são vários os fatores que favorecem a disfunção muscular, como severidade da doença, idade, uso de sedação, ventilação mecânica (VM), nutrição e imobilidade no leito. Além disso, as comorbidades podem agravar essa condição durante a internação e depois da alta.
Esse tema ficou ainda mais evidente no ambiente hospitalar a partir dos sintomas severos da COVID-19, que levaram à imobilidade de milhares de pessoas ao redor do mundo internadas em UTIs. “Quanto mais fatores de risco o paciente tiver na internação, sejam eles modificáveis ou não, maior será a ocorrência da atrofia e da disfunção muscular. A inatividade é um dos mais importantes, pois gera degradação proteica das fibras musculares. Pode haver acometimento também dos nervos periféricos por ação de citocinas inflamatórias e lesões microcirculatórias. Nesses casos, não só o músculo fica acometido, como também o estímulo nervoso. É a chamada Polineuropatia do Paciente Crítico”, explica a Fisioterapeuta.
Logo, é essencial que os Fisioterapeutas da área saibam reconhecer e tratar a disfunção muscular adquirida. Para tal, os pilares essenciais são a análise muscular com testes de força, função e acompanhamento da massa muscular por meio de ferramentas específicas e a realização da mobilização precoce destes pacientes na UTI. “Com a avaliação e intervenção precoces, a partir do momento inicial de internação, é possível não apenas minimizar os efeitos deletérios com a prescrição correta de exercícios nas diversas fases de gravidade, bem como atuar nos fatores de risco que possam ser modificáveis, como a imobilidade. Essa atuação assertiva e direcionada do profissional permite ao paciente melhores desfechos na internação”, diz a especialista.
Importante dizer que as ações devem estar alinhadas com os demais tratamentos traçados pela equipe multidisciplinar, que conversa diariamente cada caso com base em diretrizes. “Em nenhum caso trabalhamos sozinhos, somos parte de um time formado por Médicos, Enfermeiros, Técnicos de Enfermagem, Fonoaudiólogos e Nutricionistas, entre outros. Juntos discutimos as melhores condutas entre todas as especialidades, a partir do que é indicado para o paciente de acordo com a avaliação dinâmica”, pontua.
Uma das ferramentas utilizadas para a aferição muscular é ultrassonografia, que auxilia na avaliação da estrutura e função dos músculos respiratórios e periféricos. “Com essa ferramenta conseguimos mensurar as alterações de massa e o quanto e o quanto o músculo está sendo capaz de gerar contração. Aliados a esse exame devem estar os testes de função e força”, ressalta Carla.
Entre os grandes vilões da disfunção muscular está a ventilação mecânica. É necessário monitorar a ação dos músculos respiratórios nesse importante procedimento. Um dos aliados para treinar os profissionais nesse reconhecimento é o Simulador ASL 5000, um dos equipamentos mais modernos existentes no Brasil.
O equipamento consegue reproduzir variadas condições envolvendo a ventilação mecânica. No Einstein, ele também é usado para treinamentos de profissionais e nas aulas práticas de alunos das Graduações da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein (FICSAE). “Com esse aparelho conseguimos simular diversas situações presentes na beira do leito, de modo a propor soluções para tratá-las”, destaca.
A mobilização precoce deve obedecer aos preceitos de segurança do paciente de acordo com critérios de indicação já bem estabelecidos. Quando bem indicada e executada, contribui para menor tempo de ventilação mecânica, menor tempo de permanência na UTI e no hospital, além de menores taxas de mortalidade.
Produção científica da área
Pesquisas relacionadas à mobilização precoce e seus resultados têm sido recorrentes nas últimas décadas. Trata-se de um tópico presente nos principais congressos mundiais na área de terapia intensiva. Os estudos baseados em evidências científicas e protocolos bem estruturados e formalizados apontam vantagens desse procedimento.
Entre as condutas estão exercícios passivos, ativo-assistidos, ativos livres e transferências posturais (deitar-se e sentar-se no leito, sair da cama para a cadeira, ficar em pé, praticar atividades de equilíbrio, força e deambulação), além do uso de dispositivos terapêuticos nas diversas fases. “Condutas como essas aceleram o desempenho funcional do paciente de forma segura, viável e eficaz. Elas devem ser realizadas não apenas em pacientes acordados, mas também sob sedação quando indicado, reduzindo os efeitos deletérios da imobilidade desde as fases mais críticas”, recomenda a Fisioterapeuta.
Carla Luciana Batista participará do XIV Simpósio Internacional de Fisioterapia em Terapia Intensiva e do X Simpósio de Fisioterapia em Cardiologia, que acontecerá entre os dias 13 e 15 de abril de 2023. Os eventos abordarão diversos temas, entre eles a disfunção muscular de pacientes em UTI.
Palestrantes nacionais e internacionais falarão sobre outras especialidades, discutidas de modo interativo entre a audiência que estará presente para trocas e construção de conhecimentos práticos e teóricos com base em tópicos da atualidade em Fisioterapia.