Patologias durante a gestação: um alerta aos profissionais da saúde
Hipertensão, hemorragias e complicações no parto são algumas das principais patologias responsáveis por quase 75% das mortes maternas
Os dados sobre a mortalidade materna, no Brasil, que já eram uma preocupação antes da pandemia da Covid-19, passaram a causar ainda mais inquietação depois da crise sanitária. Segundo levantamento do Ministério da Saúde, que registra as mortes relacionadas a complicações na gestação, parto e puerpério em relação aos bebês nascidos vivos, os números aumentaram 94%.
Em 2019, a proporção foi 55.31 mortes para cada 100 mil nascimentos. Em 2020, a quantidade subiu para 71.97 mortes a cada 100 mil e, em 2021, chegou a 107.53 mortes a cada 100 mil. O crescimento da mortalidade materna foi de 77% entre 2019 e 2021.
Diante desse cenário, as principais patologias que representam quase 75% de todas as mortes maternas são:
- Hemorragias pós-parto;
- Hipertensão (pré-eclâmpsia e eclâmpsia);
- Infecções;
- Complicações no parto;
- Abortos inseguros.
“Entre essas complicações, a novidade está relacionada ao primeiro item. Na atualidade, o tratamento da hemorragia pós-parto faz parte de um protocolo que indica o uso da carbetocina, um medicamento muito utilizado nos Estados Unidos e na Europa”, conta a Médica Especialista em Obstetrícia de Alto Risco do Hospital Israelita Albert Einstein, Dra. Ana Paula Beck. Muito esperada por especialistas da área, essa droga deverá ser liberada para comercialização no Brasil em maio deste ano. “Essa é uma das nossas grandes expectativas do momento”, revela.
A hipertensão na gestante, segundo item, deve ser detectada e adequadamente tratada antes do início das convulsões (eclâmpsia) e de outras complicações potencialmente fatais. Para o Médico Ginecologista, integrante do Grupo de Coordenação do Programa Saúde da Mulher do HIAE, Dr. Gustavo Barison, o conhecimento de protocolos de manejo da doença e suas manifestações graves com a administração de drogas específicas como o sulfato de magnésio é fundamental, para que todos os obstetras possam investir na diminuição de riscos e, consequentemente, da morte materna.
A infecção após o parto pode ser eliminada com uma boa higienização no ambiente hospitalar, sendo que seus primeiros sinais precisam ser reconhecidos e administrados positivamente, em tempo oportuno. Ainda para evitar mortes maternas, é vital prevenir gestações indesejadas e precoces.
Últimos itens da lista das principais patologias, complicações no parto e aborto inseguro podem ser controlados com o cumprimento do pré-natal em todas as fases da gestação, indicadas e acompanhadas por uma equipe especializada de profissionais da saúde. Ela tem um papel fundamental na diminuição da mortalidade materna no Brasil.
Indicações cirúrgicas da atualidade
Para o Dr. Gustavo, os avanços cirúrgicos evoluíram significativamente no tratamento da endometriose, miomas uterinos, doenças ovarianas e cânceres ginecológicos. “A cirurgia robótica para a Ginecologia significa um progresso no tratamento dessas doenças, no diagnóstico, na preservação dos órgãos ginecológicos – priorizando o desejo reprodutivo –, no tratamento precoce de enfermidades ginecológicas benignas”, explica.
Porém, um problema é a falta de especialistas que saibam lidar e reconhecer os sintomas dessas doenças e ajudar pacientes no estado precoce, podendo levar a soluções essenciais para a saúde da mulher. “É fundamental que o Médico Ginecologista esteja sempre atualizado tanto na teoria como na prática. A participação em congressos, fóruns e seminários é muito importante, além da educação continuada”, ressalta ele.
Anemia na gestação
A Dra. Ana Paula também alerta para a necessidade da prevenção da anemia em gestantes. “Na verdade, isso deveria começar por um planejamento e avaliação médica antes da gravidez. Normalmente indicamos suplementação com ácido fólico nos meses que antecedem a gestação, além de uma alimentação bem equilibrada e saudável”. Ela explica que o recém-nascido deve ser incluído nesse cuidado.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de 50% das gestantes que vivem em países em desenvolvimento sofrem com anemia, enquanto nas regiões desenvolvidas a doença atingiria cerca de um quarto delas. “No Brasil, a previsão é de que 30% da população feminina sofra com a enfermidade, assim como 40% das gestantes, impactando negativamente a saúde da mulher de forma geral”, informa a Médica.
A especialista alerta que é muito importante haver o nível necessário de ferritina, pois essa substância reflete melhor a taxa de ferro disponível no organismo. Durante a gestação, a melhor conduta é aumentar a ingestão de ferro independentemente da alimentação adequada, entre outras vitaminas. “O importante é entender cada paciente e gerir sua suplementação”, pontua.
A literatura também indica a suplementação por ácido fólico em todo o primeiro trimestre de gestação, com o objetivo de reduzir a possibilidade de patologias no feto, como a influência negativa do mau fechamento do tubo neural, responsável por formar o sistema nervoso central durante os dias 18 e 26 de gestação.
As gestantes com muita deficiência de ferro e com mau acompanhamento do pré-natal possivelmente terão complicações no pós-parto, dando à luz crianças com desenvolvimento inadequado e saúde precária. “Isso também envolve problemas no relacionamento psicológico com o bebê tanto nos momentos da amamentação, quanto no trato em geral, devido ao mal-estar generalizado. Uma mulher doente não poderá cuidar bem de seu filho”, preocupa-se a Dra. Ana Paula.
Muitas vezes esse quadro complexo envolvendo mães e filhos gera diagnósticos errôneos de depressão pós-parto quando, na verdade, é uma anemia. Não diagnosticada ou inadequadamente tratada, essa condição pode levar à morte. “A reposição mais indicada é o ferro intravenoso aplicado somente durante a internação da paciente”, finaliza a especialista.
Ela discutirá esse assunto com mais profundidade, incluindo as mais recentes evidências científicas, no III Fórum Einstein de Saúde da Mulher, nos dias 01 e 02 de junho de 2023. Juntamente com a Dra. Ana Paula, outros especialistas debaterão práticas, apresentarão novidades da área e farão parte de dinâmicas interativas, entre outras atividades.