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Volta às escolas garante suporte emocional além da construção do conhecimento

​Especialistas do Einstein debatem a importância da escola na vida dos jovens, além de como profissionais da saúde podem auxiliar pais e filhos nesse tema.

A pandemia ocasionada pelo novo coronavírus mudou drasticamente os estilos de vida de pessoas de todo o planeta. Entre as maiores preocupações desse novo contexto estão os universos de jovens e adolescentes, alterados subitamente devido ao fechamento das escolas e universidades como medida para controlar a transmissão do antígeno.

Para produzir mais informações sobre o assunto e orientar profissionais da saúde sobre como agir diante desse panorama, o responsável pelo Núcleo de Apoio ao Estudante (NAE) da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein (FICSAE) e Médico Psiquiatra, Dr. Fabio Sato, a Médica Pediatra Infectologista do Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), Dra. Luciana Becker Mau, e a Psicóloga e Psicopedagoga (HIAE), Melina Blanco Amarins debatem questões associadas à volta às aulas.

Essa decisão, conforme o Dr. Fabio Sato, provocou inevitável influência em diversos indicadores relacionados à saúde mental de alunos. Agora, quase um ano depois do fechamento das escolas, tem se discutido a retomada das aulas presenciais em diferentes ângulos.

Segundo ele, estudos apontam um grande impacto emocional e social nesse momento da pandemia. Os sintomas mais relevantes são a carência e o medo entre crianças de três a seis anos; tédio, desatenção e dúvidas exacerbadas presentes na faixa de seis a 12 anos e irritabilidade, ansiedade e medo das consequências da doença, como a morte de pessoas próximas, mais comuns nas idades de 12 a 18.

Em relação aos jovens universitários, a preocupação envolve o tempo em frente às telas em substituição a todo o contexto que envolve as aulas presenciais e sem o acesso a atividades extracurriculares, como esportes, entretenimento e convívio social, possibilitando sintomas de ansiedade e depressão, segundo um estudo realizado pela Universidade da Colúmbia Britânica.

Além desses fatores, pesquisas destacam a perda ou aumento significativo de apetite e outras desvantagens do isolamento, que pode gerar o sentimento de solidão e falta de motivação e propósito, os quais foram evoluindo na medida em que aumentava o período da quarentena e fechamento das escolas.

Esse impedimento resultou na mudança de rotina com redução do trato social e de atividades físicas, que estão atreladas intrinsecamente ao equilíbrio mental, “além de ter contribuído claramente com o aumento do uso da internet, que não compensa as atividades presenciais. Muito pelo contrário, essa prática pode se tornar um comportamento compulsivo”, alerta o especialista.

Os estudos apontam também o padrão do sono desregulado e a dieta baseada em junk food, trazendo como consequências: o aumento do peso, a frequência de pensamentos negativos em alunos vulneráveis emocionalmente que, inclusive, podem desencadear um processo específico ligado a: ansiedade, pânico, depressão ou piora – se já adquirido – do transtorno obsessivo compulsivo.

De acordo com o Dr. Fabio, estudos constatam a associação do tédio à permanência no ambiente virtual de forma compulsiva fazendo uso de jogos, acesso a conteúdo inapropriado para certa idade e vulnerabilidade para fazer ou sofrer bullying ou assédio digital.

A recessão econômica global é um outro aspecto da pandemia com impacto direto e mais severo nas famílias menos abastadas financeiramente. Para essa classe social, o fechamento das escolas tem levado a menos regras de convivência social, à falta de alimentação (merenda), inexistência de espaço para brincar ou estudar e pouca disponibilidade de recursos online. “Outro aspecto preocupante é a exposição ao abuso e violência doméstica”.

O que é necessário para ponderar a reabertura das escolas, então?

Como é a COVID-19 para a pediatria? O que a família e os profissionais da saúde precisam saber para orientar seus pacientes? É importante saber qual é o papel do ambiente escolar no controle da pandemia e o papel dos alunos na cadeia de transmissão da doença? Qual é o momento epidemiológico ideal para o retorno às aulas?

De acordo com a Médica Pediatra Infectologista do Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), Dra. Luciana Becker Mau, em 2020, no Brasil foram registradas 87.290 internações por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) entre os menores de 19 anos, sendo que apenas 17% (14.638) estão associadas à COVID-19. “Logo, o fechamento das escolas é mais efetivo quando as taxas de ataque basais são maiores nessa faixa etária do que em adultos. O que não cabe ao novo coronavírus”.

Um estudo científico realizado na Inglaterra depois do primeiro lockdown com cerca de 928 mil estudantes por dia envolvendo menores de cinco a 18 anos de 38 mil escolas identificou 113 casos e 55 surtos do novo coronavírus. Conforme esse estudo, o risco de contágio cresceu 72% cada vez que aumentou a quantidade de cinco casos entre 100 mil pessoas da comunidade, sendo os adultos responsáveis por 73% deles.

Outra investigação realizada pela Pravaler, instituição de financiamento estudantil, divulgada em julho de 2020, aponta que estudantes universitários continuam otimistas e devem continuar seus estudos e objetivos apesar da pandemia do coronavírus.

O foco dessa pesquisa foi descobrir a opinião dos alunos diante da adoção das ferramentas remotas, além de seus anseios e preocupações. Segundo o levantamento, 35,75% estão otimistas para o mundo no pós-pandemia e, mesmo diante das dificuldades, pretendem continuar a formação superior. Entre os pontos positivos, os estudantes afirmaram que o ensino remoto permite mais tempo para a família e flexibilidade do local para o acesso às aulas.

Para entender o papel da escola no controle da pandemia, é fundamental conhecer a representação da escola na vida do aluno e da comunidade. Segundo a Dra. Luciana, é necessário avaliar o quanto faz sentindo correr algum tipo de risco contrabalançando com os benefícios recebidos pelos alunos ao frequentarem as aulas. “Acho importante fazer uma métrica para calcular o risco de contaminação dentro de determinada escola e compreender que quanto mais cumprimento das regras de biossegurança menos haverá transmissão”.

Ela explica que qualquer interação social no período de pandemia acarreta risco de contrair o vírus. Sendo assim, o plano de retorno às aulas deve ser baseado em efetivos protocolos protetivos ressaltando a real adaptação às normas. “As escolas têm um papel discreto no controle da pandemia, uma vez que os estudantes não interferem de forma abrangente na cadeia de transmissão do vírus, mas todas as medidas devem ser praticadas”.

Construção do conhecimento

Do ponto de vista da aprendizagem também é fundamental a ponderação. A Psicóloga e Psicopedagoga do Departamento Materno-Infantil e da Clínica de Especialidades Pediátricas do HIAE, Melina Blanco Amarins, atesta que o fechamento das escolas impacta significativamente no desenvolvimento do aluno.

Na adolescência os alunos estão criando conflito com os genitores para buscar suas identidades e suprir a necessidade de pertencimento a determinados grupos, desenvolvendo a capacidade de realizar reflexões, elaborar teorias e julgar moralmente as situações. “Diante disso, eles precisam do ambiente escolar como um facilitador para evoluir como pessoas e a pandemia trouxe um impedimento desse processo natural”, explica Melina.

A Psicóloga também alerta para a exposição demasiada às telas dos equipamentos eletrônicos. Ela explica que quanto mais interação nesse sentido, menos evolução no sentido afetivo e mais dificuldade para expressar sentimentos, pois a relação com o outro é um fator fundamental para a promoção das funções cognitivas e emocionais. “A escola é a segunda instituição que simboliza afeto e acolhimento, depois da família”.

A pandemia resultou em mudanças que obrigaram os estudantes a se adaptarem aos estudos por meio do ambiente virtual e, portanto, a exercitar mais concentração, movimento que produz muito desconforto e ansiedade. “Estar em casa com integrantes da família e não no espaço de aprendizagem com os colegas de classe pode abalar o interesse pela construção do conhecimento, para alguns”.

Para ela, a volta às escolas com adesão a todas as normas de biossegurança significa a continuidade da produção de conhecimento e a promoção da saúde mental sobretudo dos estudantes. “Muitos podem ser prejudicados pela dificuldade de aprender fora da sala de aula”.

Aos profissionais de saúde, a especialista aconselha a conversar e orientar pais e filhos sobre todos os assuntos ligados à pandemia, ao coronavírus e à COVID-19. “Eles devem recomendar que a família tenha diálogos utilizando linguagens adequadas e baseados na verdade. Mentir é o pior caminho”.

Melina recomenda aos pais a validação dos sentimentos dos filhos, realização de atividades em família para estimular a interação, acompanhamento das tarefas escolares, monitoramento das atividades gerais ligadas ao uso da internet e outras atitudes relevantes, já que eles exercem um papel essencial de auxiliá-los a lidarem com suas emoções.

Uma das vontades de muitos alunos hoje em dia é voltar para a escola. Outros têm medo e preferem estudar de casa. “Como profissionais precisamos respeitar opiniões e sentimentos e nos ater aos sintomas emocionais para prevenirmos desencadeamento de doenças mentais e às vezes ações irreparáveis, como o suicídio. Dar suporte e acolhimento aos pais inclusive deve fazer parte do atendimento”.

Na opinião da Médica Pediatra do HIAE, Dra. Renata Dejtiar Waksman, moderadora do debate entre os três especialistas, certos dilemas têm sido evidenciados devido à pandemia. “Infelizmente estamos vendo situações conflitantes. De um lado, muitos adultos de volta ao trabalho de forma presencial e frequentando locais públicos abertos à população muitas vezes fazendo parte de aglomerações e sem adotar as medidas de biossegurança. Do outro, estudantes sendo afetados pelo distanciamento físico, redução da interação social e uso excessivo de meios digitais de conexão”.

Conforme ela, devido aos benefícios de voltar ao espaço escolar para a maioria das famílias, crianças, adolescentes e universitários, é importante considerar a retomada das aulas presenciais e reabrir as escolas para que os alunos deixem de ser penalizados”, finaliza.

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